A Quinta Turma do Superior Tribunal de
Justiça (STJ) concedeu habeas corpus a réu acusado de homicídio, por não
ter sido apresentada ao júri a tese da inexigibilidade de conduta
diversa. Para a maioria da Turma, há cerceamento de defesa quando é
recusada a apresentação aos jurados de quesitos sobre fatos e
circunstâncias que impliquem excludente de culpabilidade.
Segundo
a denúncia, na segunda-feira do Carnaval de 1990, o réu entrou de
revólver em punho no bar onde a vítima bebia, disparando contra ela até
descarregar a arma. Em seguida, com a vítima ferida e caída, tomou uma
espingarda calibre 12 que portava no carro estacionado próximo e
disparou-a. O crime teria sido motivado por suposto assédio da vítima à
mulher do réu.
Para o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), a
falta do quesito sobre a inexigibilidade de conduta diversa não gera
nulidade, por não estar prevista em lei, apesar de admitida pela
doutrina e jurisprudência. Com a decisão estadual, a defesa recorreu ao
STJ por meio de habeas corpus.
Causa supralegal
"Com
efeito, embora a admissibilidade ou não da formulação de quesitos acerca
da tese da inexigibilidade de conduta diversa como causa de exclusão da
culpabilidade consista em uma das questões mais tormentosas tanto na
doutrina quanto na jurisprudência, hoje ela é acolhida pela maioria dos
tribunais pátrios, sendo pacífico o seu acolhimento no âmbito do STJ",
afirmou o relator, desembargador convocado Honildo Castro (já
aposentado).
"Penso que a inexigibilidade de conduta diversa
funciona como causa supralegal de exclusão da culpabilidade, devendo ser
interpretado o inciso III do artigo 484 do Código de Processo Penal,
não na sua literalidade, mas na perspectiva de que a lei não esgota a
totalidade do direito", completou. Ele citou que essa é a jurisprudência
do STJ desde o julgamento do recurso especial 2.492, relatado pelo
então ministro Francisco de Assis Toledo.
Divergência
Os
ministros Gilson Dipp e Laurita Vaz divergiram do relator. Para o
ministro Gilson Dipp, apesar de, em tese, a interpretação proposta pelo
relator ser admissível e a argumentação da defesa ser razoável, no caso
concreto a hipótese não se ajusta aos fatos.
"Admitir tal
quesito implica supor logicamente que o paciente poderia ter agido do
modo descrito na denúncia como resultante de uma conduta necessária, o
que à toda evidência parece não fazer sentido em caso de homicídio nas
condições descritas", sustentou.
"Demais, tal inteligência
significa reduzir a mulher a objeto de disposição absoluta do marido ou
companheiro, o que não tem correspondência legal", acrescentou o
ministro. "De qualquer sorte, se a inexigibilidade de outra conduta
constitui justificativa em caso de necessidade, essa exculpante é
inadmissível quando há desproporção entre o valor sacrificado e o valor
preservado", completou Dipp.
A ministra Laurita Vaz seguiu a
mesma linha. Ela apontou que o STJ tem afastado, em recurso especial,
algumas alegações de legítima defesa. "A motivação da tese de
inexigibilidade de conduta diversa constava na denúncia e, bem como
todos os fatos que materializaram o crime, foi levada ao conhecimento
dos jurados, que, mesmo assim, condenaram o réu", afirmou.
"Penso
que essa tese, na verdade, não se mostra razoável. Acredito que não é
qualquer tese de inexigibilidade de conduta diversa, pelo menos qualquer
motivação dessa tese, que deve ser submetida aos jurados", completou.
O
voto do relator foi acompanhado pelos ministros Napoleão Nunes Maia
Filho (hoje na Primeira Turma) e Jorge Mussi. A decisão, que determina a
anulação do julgamento e a realização de novo júri com a inclusão dos
quesitos, foi publicada nesta terça-feira (29).