O contrato de trabalho conta com duas
obrigações principais, não obstante a existência de obrigações acessórias. A
obrigação principal que tem como devedor o empregado e credor o empregador
corresponde à prestação de serviços (obrigação de fazer), ao passo que a
obrigação que tem como devedor o empregador e credor o empregado corresponde ao
pagamento da contraprestação pelo serviço prestado (obrigação de dar), o que se
relaciona ao conceito de remuneração.
Porém, na
realidade, remuneração consiste em gênero que abrange várias espécies.
Remuneração trata-se de toda e qualquer vantagem de conteúdo econômico recebida
pelo empregado em função do contrato de trabalho. Já o salário, espécie do
gênero remuneração, consiste na retribuição pactuada em função do serviço
prestado, de modo que uma das principais características do salário corresponde
à sua contraprestatividade.
Por outro lado, as
vantagens remuneratórias podem ser classificadas em contraprestativas,
compensatórias ou gratuitas. As contraprestativas contam com natureza salarial,
ao passo que as compensatórias contam com natureza indenizatória e as gratuitas
com natureza de liberalidade.
Não obstante a irredutibilidade do
salário, prevista no art. 7º, VI da CF, o fato é que dentre as vantagens
salariais, excluído deste universo o salário contratualmente estabelecido, há
como regra uma relação de causa e efeito. Ou seja, geralmente as vantagens
salariais sujeitam-se a uma lógica de causalidade, de modo que cessada a causa,
cessa a obrigação de pagamento.
Alguns exemplos de vantagens salariais
sujeitas a esta lógica causal: adicional noturno (Súm 265); adicional de
insalubridade (Súmula 248); diárias que assumem natureza salarial (Súm 101).
Porém, apesar da referida regra, existem
duas modalidades de exceções, uma de caráter mais puro e outra de caráter mais
híbrido.
A exceção pura ocorre no caso da
percepção da gratificação de gerência por mais de 10 anos, sem que o empregado
tenha dado causa à perda da função. Apesar da legitimidade da supressão da
função, nos termos do art. 468, parágrafo único da CLT, diante da mencionada
circunstância, conforme a tese da Súmula 372 do TST, incorpora-se a
gratificação ao patrimônio jurídico-contratual do empregado.
Já a exceção atípica ou híbrida envolve
a realização de horas extras por mais de um ano, objeto da tese da Súmula 291
do TST, alterada recentemente. No caso, firmou-se o entendimento de que, se o
empregado recebe horas extras por mais de 1 ano, a supressão garante o direito
à indenização.
Repare que é bem
verdade que há alguma influencia da lógica causal, no sentido da perda do
direito ante a cessação da causa. Porém, há uma compensação em favor do
empregado.
Ou seja, definitivamente, não há direito
à incorporação de horas extras. Porém, a supressão de horas extras garante
alguma compensação.
É preciso que se entenda que o
fundamento da referida tese, que rejeita a lógica da preservação da
estabilidade econômica na forma contemplada na Súmula 372 do TST, foi no
sentido de evitar a consolidação da extrapolação de jornada. Isto é, o
ordenamento jurídico vê nas horas extras uma exceção aceitável, mas
indesejável. Incorporar horas extras significaria dar um recado ao empregador,
no sentido de que há uma nova jornada, acima da prevista constitucionalmente.
Cabe ainda
esclarecer que a indenização devida na supressão para ser calculada conta com
os seguintes parâmetros e operações: (1) havendo mais de 1 ano de recebimento
de horas extras, apura-se o quantitativo de anos, sendo que se considera como 1
ano a fração igual ou superior a 6 meses; (2) calcula-se a média mensal de
horas extras realizadas no último ano; (3) para cada ano ou fração de ano
apurados de horas extras realizadas, considera-se uma média do último ano,
devendo ser realizada a soma das referidas médias; (4) multiplica-se o
resultado desta operação (que revela um quantitativo de horas extras) pelo
salário-hora do momento da supressão.
Apesar deste panorama, recentemente a
Súmula 291 foi alterada em perspectiva ampliativa em favor do empregado. Tal
alteração adotou o entendimento de que, mesmo no caso de supressão parcial,
aplicar-se a mencionada lógica de direito à indenização. Ou seja, se o
empregador suprime parte das horas extras, respeitadas as condições temporais
da redação anterior da Súmula 291, garante-se a indenização.
Desta forma, torna-se indiferente se a
supressão é total ou parcial, de modo que sempre o empregado terá direito a ser
indenizado.
Esta mudança revela o dinamismo do Direito do Trabalho e
da jurisprudência. A dúvida fica quanto à aplicação da tese no tempo, vez que
mudança jurisprudencial não se confunde com alteração legislativa, o que pode
levar inclusive a um estado de insegurança jurídica. Daí porque é fundamental a
veiculação da mudança ao universo mais amplo possível de profissionais do
direito, de modo a garantir a devida orientação jurídica aos empregadores,
inclusive para evitar possíveis litígios judiciais